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Deleuze (1988:118-120) – Nota sobre a filosofia da diferença de Heidegger
Parece que os principais mal-entendidos que Heidegger denunciou como contra-sensos sobre sua filosofia, após Ser e tempo
GA2
Sein und Zeit
SZ
SuZ
S.u.Z.
Être et temps
Ser e Tempo
Being and Time
Ser y Tiempo
EtreTemps
STMS
STFC
BTMR
STJR
BTJS
ETFV
STJG
ETJA
ETEM
Sein und Zeit (1927), ed. Friedrich-Wilhelm von Herrmann, 1977, XIV, 586p. Revised 2018. [GA2] / Sein und Zeit (1927), Tübingen, Max Niemeyer, 1967. / Sein und Zeit. Tübingen : Max Niemeyer Verlag, 1972
e Que é metafísica’?, incidiam sobre o seguinte: o NÃO heideggeriano remetia, não ao negativo no ser, mas ao ser como diferença; e não à negação, mas à questão. Quando Sartre
Sartre
Jean-Paul Sartre
JEAN-PAUL SARTRE (1905-1980)
Excertos, por termos relevantes, de sua obra original em francês
, no início de O ser e o nada, analisava a interrogação, ele fazia disto uma preliminar para a descoberta do negativo e da negatividade. De certo modo, era o contrário do procedimento de Heidegger. É verdade que não havia nisto qualquer mal-entendido, visto que Sartre
Sartre
Jean-Paul Sartre
JEAN-PAUL SARTRE (1905-1980)
Excertos, por termos relevantes, de sua obra original em francês
não se propunha a comentar Heidegger. Mas Merleau-Ponty
Merleau-Ponty
Maurice Merleau-Ponty
MAURICE MERLEAU-PONTY (1908-1961)
Extratos por termos relevantes
, sem dúvida, tinha uma inspiração heideggeriana mais real, quando falava de “dobra” ou de “franzido”, desde a Fenomenologia da percepção (em oposição aos “buracos” e “lagos de não-ser” sartrianos) — e quando voltava a uma ontologia da diferença e da questão em seu livro póstumo, O visível e o invisível.
As teses de Heidegger podem ser assim resumidas: 1.°, o não não exprime o negativo, mas a diferença entre o ser e o ente. Cf. prefácio de Vom Wesen des Grundes [GA9
GA9
Wegmarken
GA9PT
GA9ES
GA9EN
CartaH
Wegmarken (1919–1961), ed. Friedrich-Wilhelm von Herrmann, 1. Auflage 1976. 2., durchgesehene Auflage 1996
]. 31e éd., 1949: “A diferença ontológica é o não entre o ente e o ser” (e posfácio de Was ist Metaphysik? [GA9
GA9
Wegmarken
GA9PT
GA9ES
GA9EN
CartaH
Wegmarken (1919–1961), ed. Friedrich-Wilhelm von Herrmann, 1. Auflage 1976. 2., durchgesehene Auflage 1996
], 4e éd.. 1943: “O que nunca é em parte alguma um ente não se desvela como o Ser-diferenciador de todo ente?” (p. 25); 2.° esta diferença não é “entre. . . ”, no sentido ordinário da palavra. Ela é a Dobra. Zwiefalt. Ela é constitutiva do ser e da maneira pela qual o ser constitui o ente no duplo movimento da “clareira” e do “velamento”. O ser é verdadeiramente o diferenciador da diferença. Daí a expressão: diferença ontológica. Cf. Dépassement de la métaphysique, tradução francesa, in Essais et conférences [GA7
GA7
GA 7
GA VII
GA7PT
GA7FR
GA7ES
Vorträge und Aufsätze (1936–1953), ed. Friedrich-Wilhelm von Herrmann, 2000. — Ensaios e conferências
], pp. 89 sq.; 3.° a diferença ontológica está em correspondência com a questão. Ela é o ser da questão que se desenvolve em problemas, balizando campos determinados em relação ao ente. Cf. Vom Wesen des Grundes, tradução francesa, in Qu’est-ce que la métaphysique?, pp. 57-58; 4.° assim compreendida, a diferença não é objeto de representação. A representação, como elemento da metafísica, subordina a diferença à identidade, relacionando-a a um tertium como centro de uma comparação entre dois termos julgados diferentes (o ser e o ente). Heidegger reconhece que este ponto de vista da representação metafísica está ainda presente em Vom Wesen (cf. tradução francesa, p. 59, onde o terceiro é encontrado na “transcendência do ser-aí”). Mas a metafísica é impotente para pensar a diferença em si mesma e a importância daquilo que separa como daquilo que une (o diferenciador). Não há síntese, mediação nem reconciliação na diferença, mas, ao contrário, uma obstinação na diferenciação. É esta a “virada“, para além da metafísica: “Se o próprio ser pode aclarar em sua verdade a diferença, que ele preserva em si, do ser e do ente, ele o pode somente quando a própria diferença se manifesta especialmente…” (Dépassement de la métaphysique, p. 89). Sobre este ponto, cf. Beda Allemann
Allemann
ALLEMANN, Beda
, Hölderlin
Hölderlin
FRIEDRICH HÖLDERLIN (1770-1843). La poesía de Holderlin está sustentada por el destino y la determinación poética de poetizar propiamente la esencia de la poesía. Para nosotros, Holderlin es en sentido eminente el poeta del poeta. (GA39 p. 32)
et Heidegger, tradução francesa, Presses Universitaires de France, pp. 157-162, 168-172, e Jean Beaufret
Beaufret
Jean Beaufret
JEAN BEAUFRET (1907-1982)
, Introdução ao Poème de Parménide
Parmenides
Parménide
Parmênides
H questiona em direção a Parmênides: como ouvir com uma orelha grega este verbo "ser"? (LDMH)
, Presses Universitaires de France, pp. 45-55, 69-72; 5.° portanto, a diferença não se deixa subordinar ao Idêntico ou ao Igual, mas deve ser pensada no Mesmo e como o Mesmo. Cf. Identität und Differenz (GA11
GA11
GA 11
GA XI
GA11HCEF
GA11CL
GA11JAE
GA11Q1-2
GA11Q3-4
GA11JS
GA11ES
TK
QueFilosofia
Identität und Differenz (1955-1957) [2006] — Identidade e Diferença
; Gunther Neske, 1957) e L’homme habite en poète, tradução francesa, in Essais et Conferences [GA7
GA7
GA 7
GA VII
GA7PT
GA7FR
GA7ES
Vorträge und Aufsätze (1936–1953), ed. Friedrich-Wilhelm von Herrmann, 2000. — Ensaios e conferências
], p. 231: “O mesmo e o igual não se recobrem, tanto quanto o mesmo e a uniformidade vazia do puro idêntico. O igual sempre se liga ao sem-diferença, a fim de que tudo se ajuste nele. O mesmo, ao contrário, é o pertencimento mútuo do diferente a partir da reunião operada pela diferença. Só se pode dizer o mesmo quando a diferença é pensada… O mesmo descarta todo desvelo em resolver as diferenças no igual: sempre igualar e nada mais. O mesmo reúne o diferente numa união original. O igual, ao contrário, dispersa na unidade insípida do uno simplesmente uniforme”.
Reteremos, como fundamental, esta “correspondência” entre diferença e questão; entre a diferença ontológica e o ser da questão. É de se perguntar, todavia, se o próprio Heidegger não favoreceu os malentendidos com sua concepção do “Nada”, com sua maneira de “barrar” o ser, em vez de colocar entre parênteses o (não) do não-ser. Além disso, basta opor o Mesmo ao Idêntico para pensar a diferença original e arrancá-la das mediações? Se é verdade que certos comentadores puderam reencontrar ecos tomistas em Husserl
Husserl
Edmund Husserl
EDMUND HUSSERL (1859-1938)
, Heidegger, ao contrário, está do lado de Duns Scot e dá um novo esplendor à Univocidade do ser. Mas opera ele a conversão pela qual o ser univoco só deve dizer-se da diferença e, neste sentido, girar em torno do ente? Concebe ele o ente de tal modo que seja este verdadeiramente subtraído a toda subordinação à identidade da representação? Não parece, levando-se em conta sua crítica do eterno retorno nietzscheano.
Ver online : Gilles Deleuze
DELEUZE, Gilles. Diferença e Repetição. Tr. Luiz Orlandi e Roberto Machado. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1988