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Benoist (JBBS) – Problema da percepção

sexta-feira 13 de junho de 2025, por Cardoso de Castro

JBBS

Um problema ocupa um lugar central na filosofia da mente contemporânea: o problema da percepção.

Sem dúvida, certa filosofia nos acostumou tanto a ele que já nem o notamos, mas há aí, em si mesmo, algo de insólito. Pois por que a percepção constituiria um problema tão grande? Em certo sentido, nada parece menos problemático que a percepção. Basta abrir os olhos e percebo. E se os fecho, continuo a perceber – não mais a mesma coisa, mas ainda se trata de percepção.

A filosofia, no entanto, em geral, só tem os problemas que ela mesma cria. Que problema terá ela criado sob o título de "problema da percepção"?

Parece que este se apresenta como um caso particular daquele, geral, colocado pela epistemologia moderna: o do "acesso" da mente ao mundo. Pergunta-se como a mente poderia entrar em relação com coisas de modo que elas tenham um lugar identificável na ordem de um mundo, de modo que sejam "objetos". Kant   deu sua forma clássica a essa questão, segundo a qual seria a da relação da "quilo que em nós se chama representação com um objeto". Nesse contexto teórico, a percepção é abordada como uma forma de acesso, e a questão que lhe é colocada é saber como ela pode fornecer esse acesso.

O ponto importante é então precisamente que o acesso em questão é acesso a objetos como tais. Seguindo o exemplo de Frege, é o morango que percebo à beira do caminho se estou passeando no campo, e não, por exemplo, simples sensações indeterminadas no sentido de que não se saberia do que elas são sensações. A percepção é, como se diz, percepção "do próprio objeto".

Certa filosofia quer considerar esse fato como muito enigmático. O que permite à percepção qualificar o percebido dessa maneira, fazer com que ele apareça como um objeto, pergunta ela? A única resposta que pode encontrar, kantiana em seu espírito, se não em sua letra, é que o pensamento deve intervir aqui. O que determina o objeto da percepção – e lhe permite, portanto, ser um objeto – é, necessariamente, um pensamento. Se vejo o morango – e não uma vaga sensação daquilo que não identificaria exatamente como tal – é porque penso que é um morango. É basicamente o que diz Frege.

Tal ideia desperta um certo tipo de resistência imediata: ela choca o sentimento que temos da originalidade e da originariedade da percepção em relação a qualquer forma de pensamento. Originalidade: é muito difícil negar a especificidade daquilo que chamamos "percepção", em relação ao pensamento. Ver um morango e pensar que há um morango, certamente não é o mesmo tipo de experiência. Originariedade: realmente não parece que seja necessário pensar que há um morango para ver um, e que algum pensamento desse tipo esteja envolvido, inclusive de forma subjacente, na experiência que consiste em ver o morango. A percepção, salvo casos especiais (e há alguns, certamente), não parece, como se diz, "depender do pensamento".

Mas então, como é possível que ela seja, que ela permaneça percepção de objetos? Tal é o problema, pós-fregeano, no qual se engajou toda uma vertente da filosofia da mente contemporânea, e o problema que essa filosofia chama de "problema da percepção".

Antes de nos debruçarmos sobre a resposta proposta a essa questão por certa tradição filosófica – a fenomenologia –, é importante destacar mais uma vez seu caráter, por assim dizer, fabricado. Há, no fim das contas, algo muito estranho em perguntar como a percepção pode ter acesso a seu objeto, como se houvesse aí um problema que ela devesse resolver – e tal que, se não o resolve pela via dos conceitos, a solução é decididamente enigmática –, pois a percepção não é justamente aquilo para o qual esse problema está sempre já resolvido, ou seja, também aquilo para o qual não faz sentido colocá-lo?

Na realidade, pode-se antes perguntar se a questão do acesso, tal como percorre a filosofia moderna (isto é, aquela que separou a mente do mundo), não supõe sempre a percepção já dada como forma inquestionável de acesso. Uma forma de acesso tão evidente que nem faz mais sentido chamá-la de "acesso", pois não há nenhum passo a ser dado. Segundo tal inversão de perspectiva, seria então porque já estamos, e de qualquer forma, no meio das coisas – aquilo que se chama "percepção" – que o problema do acesso (para os pensamentos, não para as percepções) poderia se colocar, e não o contrário.

Desse ponto de vista, ver-se-á que há uma verdadeira ambiguidade na lição da fenomenologia sobre a percepção: ela consistiria em uma certa solução, original, daquilo que chamamos de "problema", ou em sua dissolução pura e simples, em uma tomada de consciência mais originária do que é perceber?

À primeira vista, a fenomenologia parece trazer uma certa resposta ao "problema da percepção", uma resposta cuja simplicidade só é igualada por sua radicalidade. Essa resposta consiste, de certo modo, em cortar o nó górdio, reconhecendo à própria percepção, como uma propriedade que lhe seria intrínseca, o poder de fazer aquilo de que certa filosofia se espanta que ela faça e busca explicar que ela possa fazer.

Isso é verdade em vários níveis, na medida exata em que o "problema da percepção" tal como entendido pela filosofia pode se dividir em vários subproblemas. A cada um desses subproblemas, a fenomenologia responde de forma análoga.