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Barbuy: A Nação e o Romantismo

sexta-feira 8 de outubro de 2021, por Cardoso de Castro

3. O método da Einfühlung — compenetração simpática — de Herder, com a ideia da originalidade de cada cultura, se reproduz na obra de Niebuhr, famoso historiador de Roma, que lançou as bases duma visão nova da Antiguidade e que nos mostra o desenvolvimento de Roma até as guerras púnicas, como um todo coerente e não como série mecânica de fatos arbitrários. A Escola Histórica encontrou um de seus pontos mais altos no exame feito por Niebuhr das lendas que envolvem a história primitiva de Roma e na comparação dessas lendas com os Eddas germânicos e a Canção de Hildebrando.

Na Escola Histórica não cabia de modo algum a noção positivista de “fato” político, de “fato” social, ou de “fato” social, ou de “fato” econômico, porque o “fato” como significando o já feito, o já acabado e morto, é a negação da História vista como processual e dinâmica; os fatos são apenas símbolos de fluxos mais profundos e só valem como indicações do processo que revelam. Assim, a noção mecânica de causa e efeito (e de cultura como adição acumulativa), nos processos históricos, que foi combatida por todos os românticos (e combatida como estreita visão burguesa do mundo) é inteiramente substituída pela visão orgânica e processual dos grandes movimentos, onde, como bem argumentou Spengler  , na Introdução da Decadência do Ocidente, não cabem as noções de causa e efeito, nem portanto a de determinismo. — Organicista e historicista é também a obra do ingente historiador, Leopold von Ranke. Autor de uma História da Alemanha na Época da Reforma, e de outras grandes obras sobre o Papado, sobre a Inglaterra e a França, — onde mostra organicamente a formação dos Estudos modernos desde a Renascença —- Ranke adotou a nomenclatura de Fichte  , que distinguia entre povos romanos e germânicos; mostrando a unidade das ações e reações de romanos e germanos, teve o ideal do universo europeu como Nação Romano  -Germânica, cujo centro de gravidade era a Alemanha. — Ranke procurou por toda parte a síntese dos contrastes, síntese que só pode dar-se nas ideias-mestras sucessivas que dirigem as épocas. Suas elaborações sobre a História Universal o levaram a conceber a História como processo do Espírito. — Mas, o que é essencial em Ranke é que, nesse processo, cada Estado se concebe como personalidade característica: Em seu Diálogo Político, sublinha o papel da vida original dos povos, que dá forma e conteúdo às instituições políticas. As instituições políticas são recipientes vazios, são entidades mortas, sem essa íntima energia vital dos povos, que lhes dá vida e sentido.

Se nos colocamos na perspectiva da Escola Histórica, nada nos parecerá mais digno de lástima do que a noção contratualista da perfectibilidade humana indefinida, que pretende fabricar constituições perfeitas para toda e qualquer nação, com o total desprezo de suas peculiaridades, de sua história e suas formas de vida. As nações — dizia Ranke — são seres espirituais, são criações originais do gênio humano e são individualidades em si. A constituição social e a vida política devem representar o princípio espiritual característico de cada Nação, concebendo-se cada Nação como indivíduo singular, distinto de todos os demais, apesar das semelhanças e conexões históricas. As Nações segundo Ranke são, portanto, totalidades individuais, portadoras de princípios próprios imanentes; são pensamentos divinos, como se lê no Diálogo Político. Também Mommsen, que não valoriza excessivamente as origens nacionais, nos fala, desde o começo da sua História Romana, da evolução própria e individual das nações, com seu ciclo de juventude, de maturidade e de velhice. Mommsen observa que, — ao contrário dos Gregos, cuja unidade nacional se manifestava nas artes e nos esportes — os Romanos foram o único povo da antiguidade que soube constituir sob forma política a sua unidade nacional característica.

Para uma visão de conjunto da obra de Leopold von Ranke, leia-se a conferência comemorativa pronunciada em 1936, na Academia Prussiana de Ciências, por Friedrich Meinecke, e publicada como apêndice da grande obra sobre o Historicismo e sua gênese (trad. esp. Fondo de Cultura, México, 1943).