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Estrutura do si-mesmo (Caron)
domingo 18 de maio de 2025, por
Mas não há contradição em falar de estrutura a respeito de um ser como o si-mesmo? A estrutura é a totalidade que une em um mesmo sítio uma multiplicidade de fenômenos complexos. A noção de estrutura parece, infelizmente, próxima das noções de substância ou de sujeito. Buscar a estrutura é buscar algo total e idêntico, a coesão em um Mesmo, uma entidade orgânica cuja essência permita coordenar, em torno de um eixo de coerência preciso e determinado, uma diversidade de fenômenos. Mas quando se trata do si-mesmo, sempre aberto, imperceptivelmente desdobrado antes de ser mediatamente dobrado, como pretender, nem que seja por um instante, reencerrar tal ser em uma unidade e falar de "estrutura"? Correndo o risco de nos proibir toda investigação, é preciso entender o conceito de estrutura em um sentido diferente daquele que estamos acostumados a escutar.
Sigamos, para isso, a abordagem heideggeriana que, ao mesmo tempo que empreende uma "des-estruturação" de toda estrutura indevidamente fixada, não se proíbe de visar e pensar, ainda assim e apesar de tudo, a estrutura. Para pensar o si-mesmo, é preciso primeiro desconstruir o eu substancial da metafísica da subjetividade; desconstruí-lo, ou seja, resolvê-lo em seus pressupostos e deixá-lo ser absorvido a montante por estes últimos. Mas isso supõe, desde então, este dado fundamental: para pensar o eu, é preciso permanecer atento à estrutura que o si-mesmo constrói e tece ele mesmo no eu. Nele, o si-mesmo se estrutura e se estabelece em diferentes estruturas. Chega-se assim à seguinte distinção: de um lado, o estruturado, o eu, o resultado de um processo de estruturação que o ultrapassa e o transcende; de outro, o próprio ato de estruturar ou de se estruturar. Segundo essa distinção, é possível destacar uma dupla significação do problema colocado pela tentativa de pensar a estrutura do si-mesmo: como genitivo objetivo, a estrutura do si-mesmo é o que dá sentido à modalidade de ser particular do si-mesmo; como genitivo subjetivo, a estrutura do si-mesmo sublinha o ser do si-mesmo enquanto ele se estrutura, se reúne e se recolhe ele mesmo em um ponto, o eu (que pode decair e esquecer que tudo lhe vem do processo desse ser-fora-de-si essencial).
Colocar-se em busca da estrutura do si-mesmo é, portanto, antes de tudo, praticar uma destruição, no sentido de uma desestruturação ou desestrut(ura)ção, um desobstrução do ego a fim de retornar, para além do pensamento que o pensa metafisicamente segundo o cânone do ὑποκείμενον, à fonte onde ele busca sua fenomenalização. É, em seguida, colocar-se em busca da unidade de uma doação não-una. Consequentemente, o termo "estrutura" só será entendido e compreendido como unificação fechada por aquele que, incapaz de pensar uma outra forma de realidade mais profunda que a do ente imediatamente presente sob seus olhos, permanece igualmente impotente para pensar a possibilidade de uma mesmidade não-identitária, aberta e de certo modo não-una embora mesma.
O pensamento imediato raciocina segundo o seguinte silogismo: não podendo determinar estrutura senão daquilo que é, e não conhecendo como realidade senão a realidade ôntica imediata do ente dado, deduz-se que não existe nenhuma estrutura daquilo que não é sob o modo do ente; ora, o si-mesmo não é sob o modo do ente; é preciso, portanto, ou negar sua existência, ou reduzi-lo a esquemas já conhecidos. Consequentemente, se a finalidade de nossa investigação é a liberação da essência do si-mesmo e a busca de um único sentido de ser de suas diversas e diferentes aparências, o termo "estrutura" não pode, no entanto, ser empregado senão em uma significação nova, a saber, não como unificação fechada de uma diversidade, mas como pensamento visando o desprendimento da unidade não-una de um não-ente. O único método que esta investigação da estrutura do si-mesmo e da origem da subjetividade se autoriza é, em última instância, um deixar-se abrir aquilo que de si já é abertura. É por isso que o plano desta obra será composto de dois momentos essenciais: primeiro, manifestar a abertura; segundo, saltar nela a fim de compreendê-la deixando-nos com-preender por ela.