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Schopenhauer (SQRPRS:§42) – Sujeito do querer
terça-feira 30 de junho de 2020
De acordo com o que foi dito acima (vide), o sujeito do conhecer nunca pode ser conhecido, nem jamais se tornar objeto, representação. Todavia, uma vez que não temos apenas um autoconhecimento externo (na intuição sensível), mas também um autoconhecimento interno, e que todo conhecimento, em consequência de sua essência, pressupõe um conhecido e um cognoscente, então, o conhecido em nós, enquanto tal, não é o cognoscente, mas o querente, o sujeito do querer, a vontade. Partindo da cognição, pode-se dizer que “eu conheço” seria uma proposição analítica; em contrapartida, “eu quero” é uma proposição sintética e, com efeito, a posteriori, a saber, dada por meio da experiência, aqui experiência interna (isto é, apenas no tempo). Nessa medida, portanto, o sujeito do querer seria, para nós, um objeto. Quando olhamos em nosso interior, encontramos a nós mesmos sempre como querendo. No entanto, o querer tem muitos graus, do mais leve desejo até a paixão; e que não somente todos os afetos, mas também todos os movimentos de nossa interioridade, que subsumimos sob o vasto conceito de sentimento, são estados da vontade, eu expliquei muitas vezes, por exemplo, nos Problemas fundamentais da ética, p. 11, e também em outros lugares.
Mas a identidade do sujeito do querer com o sujeito cognoscente, em virtude da qual (necessariamente) a palavra “eu” encerra e designa ambos, é o nó do universo, e, em razão disso, inexplicável. Pois somente as relações entre os objetos são compreensíveis para nós; entre tais relações, porém, dois só podem ser um na medida em que forem partes de um todo. Aqui, em contrapartida, quando se fala do sujeito, não valem mais as regras para o conhecimento dos objetos, e uma efetiva identidade do cognoscente com o conhecido, reconhecido como querente – portanto, do sujeito com o objeto – é imediatamente dada. Mas quem tornar presente para si, corretamente, o inexplicável dessa identidade, a denominará, como eu, o milagre κατ’ἐξοχήν [por excelência].
Como, pois, o correlato subjetivo da primeira classe de representações é o entendimento, o da segunda é a razão, o da terceira é a sensibilidade, assim nós encontramos como o correlato desta quarta classe o sentido interno, ou, em geral, a autoconsciência.
[Excerto de SCHOPENHAUER , Arthur. Sobre a Quadrúplice Raiz do Princípio de Razão Suficiente. Tr. Oswaldo Giacoia Jr. & Gabriel Valladão Silva. Campinas: Editora UNICAMP, 2019]
Ver online : On the Fourfold Root of the Principle of Sufficient Reason and Other Writings