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Pascal (P:688/323) – O que é o eu?
sexta-feira 22 de maio de 2020
Um homem que se põe na janela para ver as pessoas que passam; se passo por ali, posso dizer que ele se pôs na janela para me ver? Não; porque ele não está pensando em mim particularmente; mas quem ama alguém por causa de sua beleza, ama mesmo? Não, porque as bexigas, que matará a beleza sem matar a pessoa, fará com que ele não a ame mais.
E se me amam pelo meu juízo, por minha memória, amam-me mesmo? a mim? Não, pois posso perder essas qualidades sem perder-me a mim mesmo. Onde está então esse eu, se não está no corpo, nem na alma? e como amar o corpo ou a alma, senão por essas qualidades que não são o que fazem o eu, pois que são perecíveis? porque alguém amaria a substância da alma de uma pessoa, abstratamente, e algumas qualidades nela existentes? Isso não é possível, e seria injusto. Portanto nunca se ama ninguém, mas somente qualidades.
Não se zombe mais então daqueles que se fazem honrar por cargos e ofícios, pois não se ama ninguém a não ser por qualidades postiças.
[Excerto de PASCAL , Blaise. Pensamentos. Tr. Mario Laranjeira. São Paulo: Martins Fontes, 2005, § 688/323]
Ver online : PASCAL - PENSAMENTOS