Fenomenologia, Existencialismo e Daseinsanálise

Às coisas, elas mesmas

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SZ:206-208 – Idealismo e Realismo

segunda-feira 4 de novembro de 2024

Na investigação precedente, não se pode discutir amplamente a variedade de tentativas de solucionar o “problema da realidade”, formada pelas diferentes espécies de realismo e idealismo e de suas mediações. Por mais que, em todas essas espécies, se possa encontrar um germe de questionamento autêntico, seria absurdo pretender solucionar o problema somando tudo o que é correto em cada um. Ao contrário, é preciso que se compreenda fundamentalmente que as diversas direções epistemológicas não são deficientes quanto à epistemologia, mas que, devido ao descaso da analítica existencial da presença [Dasein], elas não podem absolutamente conquistar o solo para uma problemática segura de suas bases. Esse solo também não pode ser conquistado através de melhorias fenomenológicas posteriores dos conceitos de sujeito e consciência (Bewusstsein) [1]]. Pois, com isso, não se pode ainda garantir que a colocação da questão se faça adequadamente.

Com a presença [Dasein] enquanto ser-no-mundo, o ente intramundano já sempre se descobriu. Esse enunciado ontológico-existencial parece concordar com a tese do realismo em que o mundo externo é real, ou seja, é algo simplesmente dado. Na medida em que, no enunciado existencial, não se nega o ser simplesmente dado dos entes intramundanos, ela concorda – por assim dizer doxograficamente – com a tese do realismo. Ela se diferencia, porém, em seus fundamentos de todo realismo porque o realismo toma a realidade do “mundo” como algo que necessita de prova e, ao mesmo tempo, como algo que pode ser comprovado. Em contrapartida, no enunciado existencial ambos são negados. O que a separa totalmente do realismo é a incompreensão ontológica de que sofre o realismo. Ele tenta esclarecer a realidade onticamente mediante o contexto efetivo e real entre as coisas reais.

Com relação ao realismo, o idealismo possui uma primazia fundamental, por mais oposto [2] e insustentável que seja no que respeita aos resultados, desde que ele próprio não se compreenda equivocadamente como idealismo “psicológico”. Quando o idealismo acentua que ser e realidade apenas se dão “na consciência” (Bewusstsein), exprime, com isso, a compreensão de que o ser não deve ser esclarecido pelo ente. Como, porém, não se esclarece que aqui se dá uma compreensão de ser e o que diz ontologicamente essa compreensão, isto é, que ela pertence [3] à constituição de ser da presença [Dasein] e como ela é possível, o idealismo constrói no vazio a interpretação da realidade. Que não se pode esclarecer o ser pelo ente e que a realidade só é possível numa compreensão ontológica, isso não dispensa um questionamento do ser da consciência (Bewusstsein), da própria res cogitans. Como consequência à tese idealista, a própria análise ontológica da consciência (Bewusstsein) é pressignada como uma tarefa preliminarmente inevitável. Somente porque o ser é “na consciência” (Bewusstsein), ou seja, é compreensível na presença [Dasein], a presença [Dasein] pode compreender caracteres ontológicos como independência, “em si”, realidade em geral, e conceituá-los. Apenas por isso o ente “independente” pode fazer-se acessível como algo intramundano, que vem ao encontro na circunvisão.

Se o título idealismo significar o mesmo que compreender a impossibilidade de se esclarecer [4] o ser pelo ente, mas que, para todo ente, o ser já é o “transcendental”, então é no idealismo que reside a única possibilidade adequada de uma problemática filosófica. Nesse caso, Aristóteles Aristoteles
Aristote
Aristóteles
Aristotle
Para Heidegger, Aristóteles é com efeito toda a filosofia, por esta razão passou sua vida a situar, demarcar, mensurar, em resumo questionar em sua dimensão mesma de lugar, este lugar comum a toda humanidade.
não teria sido menos idealista do que Kant Kant Emmanuel Kant (Immanuel en allemand), 1724-1804, é um dos autores de predileção de H., um daqueles do qual mais falou. . Se, porém, idealismo significar a recondução de todo ente a um sujeito ou a uma consciência (Bewusstsein) que, por sua vez, se caracteriza como o que permanece indeterminado em seu ser, sendo, no máximo, caracterizado negativamente como uma “não coisa” então, do ponto de vista do método, esse idealismo se mostra tão ingênuo quanto o realismo mais grosseiro.

HEIDEGGER, Martin. Ser e Tempo GA2
Sein und Zeit
SZ
SuZ
S.u.Z.
Être et temps
Ser e Tempo
Being and Time
Ser y Tiempo
EtreTemps
STMS
STFC
BTMR
STJR
BTJS
ETFV
STJG
ETJA
ETEM
Sein und Zeit (1927), ed. Friedrich-Wilhelm von Herrmann, 1977, XIV, 586p. Revised 2018. [GA2] / Sein und Zeit (1927), Tübingen, Max Niemeyer, 1967. / Sein und Zeit. Tübingen : Max Niemeyer Verlag, 1972
. Tradução revisada de Marcia Sá Cavalcante Sá Cavalcante
Marcia Sá Cavalcante
Marcia Schuback
Schuback
STMS
Marcia Sá Cavalcante Schuback
Schuback Sá Cavalcante
Marcia Sá Cavalcante
Marcia Schuback
Schuback
STMS
Marcia Sá Cavalcante Schuback
. Petrópolis: Vozes, 2006, p. 275-277


Ver online : Sein und Zeit [SZ]


[1CH: salto para dentro da presença [Dasein

[2CH: a saber, à experiência ontológico-existencial

[3CH: a presença [Dasein], porém, (pertence) à essência do ser como tal

[4CH: diferença ontológica