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La Genèse du phénomène

Loreau (1989:17-23) – A palavra e a experiência da visão

Le Phénomène, le logos, l’origine

  • O logos e a palavra como condição de possibilidade do sentido e da experiência do fenômeno

    • A palavra torna possível a questão do sentido e o próprio sentido, constituindo o fundamento da experiência enquanto tal.
    • A ausência da palavra implicaria a inexistência de fenômenos, de ser e de pensamento, reduzindo a experiência a uma pura visão sem consciência.
    • O logos é aquilo que permite que haja fenômenos, pensamento e comunidade do “nós”; é pela palavra que o fenômeno se manifesta e pode ser interrogado.
    • A experiência dos fenômenos constitui o ponto de partida para a interrogação da palavra, enquanto ela mesma é pressuposta nessa experiência.
  • A dificuldade de apreender a ação da palavra e sua anterioridade ontológica

    • A palavra, quando se deixa emergir sob o olhar do pensamento, revela-se difícil de surpreender em seu próprio ato.
    • Captá-la é já colocá-la em movimento; ela é anterior a si mesma e só pode interrogar-se a partir de si.
    • Toda investigação sobre a palavra supõe já o exercício da palavra a partir de um fundo oculto que a precede.
  • A palavra como fenômeno onipresente e condição de toda manifestação

    • A palavra é um “fenômeno” inseparável do ser; nada é percebido ou sentido sem que ela esteja em ação.
    • Sendo anterior a si mesma, ela é também anterior ao ser e aos fenômenos, funcionando como o meio e o círculo em que tudo acontece, inclusive o visível.
  • O enigma da autointerrogação da palavra e a possibilidade de ruptura interna

    • A palavra parece condenada a permanecer escondida em sua própria anterioridade, o que coloca o problema de como interrogá-la.
    • Surge a hipótese de que exista em seu interior um elemento discordante capaz de desestabilizar sua auto-interpretação e forçá-la a reconfigurar sua essência.
    • A emergência desse fator provocaria uma nova relação da palavra consigo mesma e poderia engendrar outra palavra, dotada de nova essência.
  • A função aparente da palavra como prolongamento e expressão da ideia

    • A palavra parece apenas prolongar a ideia, emprestando-lhe voz e uma existência efêmera.
    • Mesmo a palavra interior dá vida passageira ao ser imutável do pensamento e logo se apaga, deixando “nada além de um sopro, uma vibração e um desaparecimento”.
    • Contudo, tal concepção já supõe um discurso interior da palavra sobre si mesma e implica uma tensão entre a ideia e sua expressão.
  • A palavra como elemento que transforma e fragiliza o ser da ideia

    • A palavra não se limita a expressar a ideia, mas modifica sua essência, introduzindo nela uma abertura e uma profundidade indefinida.
    • Sua presença constante e seu aparente apagamento revelam uma irredução essencial, pois ela precede aquilo que parece secundar — o eidos.
    • Ao afetar o eidos, a palavra abala a própria forma do visível e questiona o fundamento do verdadeiro, pondo em risco a evidência e a presença.
  • A palavra como movimento de autoadvenimento e temporalidade total

    • Diferente da visão, a palavra nunca é dada; é um movimento de advir.
    • Ela só pode ser compreendida a partir de seu próprio movimento, sendo sempre referência a um “antes” de si — a palavra antes da palavra.
    • A palavra é simultaneamente presente, passada e futura, afirmando-se num único instante em que todo o tempo se condensa.
  • A dupla origem da palavra e o paradoxo de sua autocompreensão

    • A palavra pressupõe sua origem na visão de um visível, mas também afirma que provém apenas da palavra.
    • Para ser palavra — e não visão —, deve trazer em si a consciência de ser “outra”, ou seja, invisível.
    • A visão só reconhece o visível, mas a palavra contém uma dimensão que permanece invisível e lhe é própria.
    • Assim, a palavra é relação consigo mesma, surgindo de si e por si, como espontaneidade e autoprodução.
  • A tensão entre as duas origens da palavra: a vista e a não-vista

    • A palavra se atribui duas origens: a vista, comum à do pensamento, e a palavra mesma, concebida como não-vista.
    • Essa tensão define sua compreensão implícita: ela acredita derivar da visão, mas é simultaneamente sua pressuposição e condição.
    • O exame dessa relação paradoxal conduz à necessidade de reconsiderar a essência dos vínculos entre visão e palavra.
  • A via da visão como caminho para reexaminar a essência da palavra

    • A análise parte da experiência da visão, tida como natural, para investigar as ligações secretas entre visão e palavra.
    • A tarefa consiste em expor os conceitos e relações elementares que estruturam a representação da palavra e confrontá-los com a experiência efetiva da palavra.
    • Caso se revele um descompasso entre esses conceitos e a experiência, isso exigirá a revisão dos fundamentos da filosofia, atingindo o ponto crítico (krino) de sua própria decisão e separação.
  • A origem platônica da primazia da visão e a subordinação da palavra

    • Os conceitos primordiais da compreensão derivam da primazia da visão, cuja genealogia remonta a Platão.
    • Na “República”, ao investigar o Bem, a filosofia parte da visão iluminada pela Luz como via para o conhecimento.
    • A visão é o sentido que estabelece uma relação sem contato, pura e imaterial, ligando-se ao eidos, o “rosto” das coisas.
    • O saber é a relação entre a visão pura e o eidos mediada pela Luz; assim, a visão é a origem do pensamento.
    • Nesse contexto, a palavra ocupa o papel de auxiliar do eidos, agente da visão e instrumento da verdade, situando-se no mesmo campo em que o fenômeno se manifesta.

Ver online : Max Loreau


LOREAU, Max. La genèse du phénomène. Paris: Editions de Minuit, 1989