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Heráclito [GA55]
GA55:195-196 – Lógica
HEIDEGGER, Martin. Heráclito. A origem do pensamento ocidental Lógica. A doutrina heraclítica do lógos. Tr. Marcia Sá Cavalcante
Sá Cavalcante
Marcia Sá Cavalcante
Marcia Schuback
Schuback
STMS
Marcia Sá Cavalcante Schuback
Schuback
Sá Cavalcante
Marcia Sá Cavalcante
Marcia Schuback
Schuback
STMS
Marcia Sá Cavalcante Schuback
. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1998, p. 207-208
“Lógica” é o nome para a “doutrina do pensamento correto” [richtigen Denken]. Ela expõe a construção interior do pensamento, as suas formas e regras. “Fazer lógica” significa, portanto, aprender a pensar corretamente. Quando o pensamento é correto? Manifestamente, quando se processa de acordo com as formas e regras estabelecidas pela lógica, correspondendo assim à “lógica”. O pensamento é correto quando é “lógico”. Diz-se que isso e aquilo é “bastante lógico”, indicando, com isso, não um pensamento e a sua correção, mas um estado de coisas (um processo ou o conjunto de fatos) que resulta, como sequência correta, de uma situação fatual das coisas. Essa “sequência correta” consiste no percurso fatual segundo o conjunto fatual das coisas. O “lógico”, a “sequência correta” e, sobretudo, o correto, residem, portanto, nas coisas e não em nosso pensamento. Falamos de uma lógica interna das coisas. Só pensamos logicamente, ou seja, corretamente, quando pensamos “coisalmente” a partir das coisas e com vistas às coisas. Como, porém, nosso pensamento pode ser coisal sem que o pensamento se entregue às coisas e atente à sua constringência? Então, a correção do pensamento está novamente devolvida ao nosso pensamento e à correta entrega do pensamento às coisas. Existe, portanto, uma “lógica” dupla, uma lógica do pensamento [Logik des Denkens] que diz como o pensamento segue e sucede corretamente às coisas, e uma lógica das coisas [Logik der Sachen] que mostra o fato e a medida em que as coisas possuem, dentro de si mesmas, uma sequência correta. As coisas não convocam e não nos convocam se não dispensamos a elas os nossos próprios pensamentos. Nosso pensamento fica, no entanto, sem sustento e oscilante se ele não se vir primeiramente convocado pelas coisas e não permanecer sob essa exigência provocadora. É estranho como, aqui, a lógica das coisas e a lógica do pensamento, como o pensamento e as coisas encontram-se numa mutualidade recíproca em que um se volta para o outro, em que um se vê provocado pelo outro. Tudo ainda se torna mais estranho quando essa exigência provocadora, em que as coisas e o pensamento se vocacionam reciprocamente, não deve provir nem das coisas e nem do pensamento. Tudo se torna enigmático quando essa exigência provocadora recai sobre as coisas e sempre já se colocou para os homens, mesmo que o homem não preste atenção à chegada dessa provocação e, muito menos, à sua proveniência.
Um indício disso talvez seja o fato de que nem a lógica do pensamento, nem a lógica das coisas — e nem ambas em sua cópula recíproca — constituam a lógica em sentido próprio. Então, a origem e o fundamento do pensamento correto, do pensamento em geral, seria algo velado para nós. Então, estaríamos na situação de nunca sabermos e de só percebermos de bem longe sob que exigência provocadora nos achamos quando tentamos seguir a intimação corriqueira de pensar corretamente. Talvez o homem, que ardilosamente não se cansa de tecer pensamentos novos, viva de há muito numa desatenção do pensamento. Isso porque se petrificou na opinião de que o pensamento não passa de um cálculo. Essa opinião é, sem dúvida, tão antiga quanto o próprio pensamento, e algum dia haveremos de perceber que o pensamento pode ser errante, e erra, em sua própria essência.
Por isso, a incorreção propriamente dita do pensamento jamais significa o erro de pensamento cometido numa sequência de passos do pensamento como, por exemplo, numa conclusão. Significa, ao contrário, que em sua própria essência e origem essencial o pensamento descuida-se de si. Será que esse descuido na própria essência pode ser o fundamento da incorreção propriamente dita do pensamento? Então, uma conjuntura diferente, e talvez bem mais elevada, é que estaria implicada na tarefa de pensar corretamente e de aprender a pensar corretamente.
(Talvez esse descuidar-se [Sichversehen] na própria essência [Wesen] constitua um dote que distingue a origem e a determinação do pensamento, e somente dele. Um dote que não deve ser pensado como mera falta, um dote que é mais a fiança sobre a qual recaem as decisões propriamente ditas, uma vez que a decisão pertence à cisão e esta, por sua vez, à incisão distintiva. Decisão só é possível onde há distinção. Como, porém, uma distinção poderia manifestar-se, se já não houvesse uma decisão e a prontidão para decidir? Decidir não é um traço fundamental do pensamento? De onde advém esse traço para o pensamento?)
Ver online : Heraclitus The Inception of Occidental Thinking and Logic: Heraclitus’s Doctrine of the Logos