Fenomenologia, Existencialismo e Daseinsanálise

Às coisas, elas mesmas

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Fink (1994:200-202) – onde e quando tem lugar o aparecer?

segunda-feira 27 de outubro de 2025

O problema é, portanto, de longe mais complexo do que em nosso ponto de partida inicial. Se o ente é aquilo que aparece, e o homem, aquele a quem ele aparece, então coloca-se a questão de saber onde e quando ocorre o aparecer das coisas para o homem. Tudo o que é, que existe no modo do ser intramundano, está em algum momento e em algum lugar. Cada coisa possui duração e lugar. Poder-se-ia, contudo, objetar que a alma humana, embora surja no tempo — como a mônada leibniziana —, não se encontra em um lugar, sendo essencialmente diferente de toda res corporea. Ser-espacial não deve ser colocado simplesmente no mesmo plano que um ser no espaço, como aquele que pertence a uma coisa corporal que ocupa um lugar e possui uma forma. A alma humana é “espacial” na medida em que “olha para dentro” do espaço das coisas corporais, na medida em que, com seu ver, olhar, escutar e ouvir, tocar e apreender, percebe no espaço. O fato de nossos sentidos estarem referidos ao espaço é um indício de que estamos, embora de outro modo, mas não menos, no espaço do que as montanhas, as estrelas, as cidades.

Com base em nossa abertura compreensiva ao espaço, situamos nosso corpo carnal (Leib), atribuímo-nos, em certa medida, um lugar no meio das coisas — aqui, na sala, ou anteriormente no bonde —, movemo-nos, em toda nossa efetividade em carne e osso, por caminhos e trilhos. O fato de as coisas se mostrarem e, de nosso lado, o ato consciente de perceber, pressupõe uma proximidade espacial e temporal.

Isto, porém, não deve ser tomado sem algumas reservas. Ao fato de o ente se mostrar corresponde um vivido subjetivo; ambos estão vinculados no onde e no quando. O mesmo onde e quando constitui a relação entre o homem e a coisa. Isso não significa que as coisas vividas por mim só possam situar-se na zona de proximidade do meu vivido, ou que possam provir apenas do ambiente próximo e imediato. O olhar pode elevar-se acima do afluxo das coisas próximas e voltar-se para as longes, o ilimitado, o aberto — como quando olhamos o mar ou quando, à noite, voltamos os olhos para o céu estrelado. Pela estrela mais longínqua que cintila estou ligado à simultaneidade do brilho e do ver. Mesmo que saibamos, por meio das pesquisas científicas, que a estrela cintilante há muito se apagou, e que apenas sua luz ainda nos alcança, tendo percorrido uma distância imensa, isso não suprime a verdade da aparência visível. Nosso vivido é contemporâneo da luz estelar, qualquer que seja o ponto em que esta se encontre em seu percurso cósmico.

Fundamentalmente, isso significa que o ser-ao-mesmo-tempo do vivido humano e do provir-de-si das coisas, em uma plenitude de determinações, propriedades e modos, possui essencialmente amplitude de mundo. A presença é a presença do mundo; a instantaneidade do “agora” é, de modo fundamental, em toda parte.

Uma questão totalmente diferente que se coloca a esse respeito é a da medida da simultaneidade. O aparecer do ente para o homem que sabe e experimenta é sempre uma relação do lugar da coisa com seu lugar, do tempo da coisa com o tempo humano. No entanto, essa relação está inserida em um espaço mais abrangente e em um tempo mais abrangente. Todos os lugares das coisas e do homem que as experimenta, assim como o tempo que inclui ambos, estão no tempo uno e no espaço uno do mundo. O espaço do mundo e o tempo do mundo são, em sua totalidade, sempre pressupostos, mas nunca dados.

Os lugares e os tempos intramundanos são, por assim dizer, fragmentos extraídos de um todo que não aparece em si mesmo, mas no qual todo aparecer do ente e todo perceber humano têm lugar e duração. Uma tomada de consciência da localidade e da temporalidade, não apenas do ser das coisas, mas também, ao mesmo tempo, de seu aparecer, de seu tornar-se objeto para uma consciência que percebe, conduz cada vez mais fundo no labirinto do problema do espaço-tempo.

Podemos, então, dizer que o lugar próprio e o tempo próprio de uma coisa qualquer “aparecem” de modo análogo em outros lugares e em outros tempos, em seus dados laterais e em seus aspectos, como uma coisa em seus “esboços”? Pode-se, em geral e com pleno direito, separar o ser e o aparecer em relação ao lugar e ao tempo? Ou lugar e tempo já estão pressupostos quando distinguimos o ser das coisas de seu aparecer?

[FINK Fink
Eugen Fink
EUGEN FINK (1905-1975)
, Eugen. Proximité et distance: essais et conférences phénoménologiques. Grenoble: Millon, 1994]


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