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L’illumination du coeur

Allard l’Olivier (IC:71-87) – Os Objetos inteligíveis

A Evidência Relativa

I. A Natureza dos Objetos Inteligíveis Elementares e a Relação com a Linguagem

  • O ser objetivo inteligível elementar é a noção utilizada pela inteligência para julgar e raciocinar, sendo expressa por um signo verbal chamado palavra, mas não se confundindo com ela, como evidenciado pela busca da palavra certa, pela expressão multilingue de um mesmo inteligível e pelas nuances de significado entre palavras aparentemente equivalentes em línguas diferentes.
  • Contra o nominalismo, que reduz a realidade a objetos sensíveis e palavras, sustenta-se a existência de inteligíveis distintos das palavras que os expressam, tal como a palavra se distingue do signo gráfico que a representa, sendo o sentido de uma palavra conferido pelo inteligível que expressa.
  • O objeto sensível é sempre singular e único, enquanto a noção é sempre geral, designando vários objetos sensíveis semelhantes que constituem uma espécie subsumível por uma única noção, embora certas noções possam ser ditas singulares quando um termo geral é usado para designar um objeto individual específico.
  • Uma palavra, a menos que seja vazia, exprime uma certa noção, um certo objeto inteligível, na língua a que pertence, podendo ser equívoca, exigindo por vezes esclarecimento, ou sinônima de outras, podendo ainda noções únicas serem expressas por signos verbais complexos, isto é, por vários palavras.

II. A Proposição como Objeto Inteligível Composto e o Ato de Reflexão

  • A proposição, mental ou oral, é uma ligação de objetos inteligíveis elementares ou dos seus signos verbais, sendo a proposição mental um objeto inteligível composto que se apresenta ao conhecedor puro como o relacionamento de pertença objetivo entre dois inteligíveis elementares, pro-postos ao proferente-visante.
  • Este relacionamento de pertença objetiva resulta de uma reflexão da inteligência sobre ações submetidas objetivamente à "visão interna" do espírito, sendo a reflexão um ato do próprio proferente que, ao se desviar do mundo sensível para considerar o mental a que se liga, se volta para um pensamento mental para fazer ato de inteligência.
  • O ato de inteligência, comum ao proferente-visante e ao mental, consiste principalmente em determinar o que pertence a uma noção escrutinada e em dizê-lo formulando um relacionamento de pertença chamado proposição, onde tudo o que é relacionável a uma noção lhe pertence a título de nota, sendo cada nota ela própria uma noção.
  • A inspeção de um objeto sensível é feita pela radicalidade subjetiva através dos sentidos, de modo mediato, podendo o objeto ser reconhecido e nomeado, levando à enunciação de proposições que expressam rapports de pertença objetivos constatados através do exame.

III. A Compreensão e a Extensão dos Objetos Inteligíveis

  • A inspeção de um objeto inteligível elementar pode ser conduzida segundo as suas duas dimensões constitutivas: a sua compreensão, que é a sua amplitude em relação às notas que o constituem e que o espírito discerne nele, e a sua extensão, que é a sua amplitude em relação aos objetos em que se realiza, que agrupa na sua unidade e que são as suas partes.
  • Do ponto de vista da compreensão, toda a proposição categórica afirmativa é uma ligação de termos que exprime a pertença de uma nota inteligível, chamada predicado, a esse objeto inteligível, que, no seio da proposição, leva o nome de sujeito lógico.
  • Do ponto de vista da extensão, ao escrutinar uma noção inteligível, distinguem-se outras noções inteligíveis que não são notas dela, mas partes que ela subsume na sua unidade e em cada uma das quais se realiza, sendo a forma clássica da proposição, "S é P", fundamentalmente compreensiva, primando sobre o ponto de vista extensivo.
  • Numa proposição "S é P", o predicado é sempre uma nota do sujeito lógico, enquanto que este só por vezes é uma parte da extensão daquele, o que justifica a primazia do ponto de vista da compreensão sobre o da extensão.

IV. A Assimetria entre Compreensão e Extensão e a Natureza da Inteligibilidade

  • A pertença do sujeito lógico ao predicado, segundo a extensão deste, é de natureza diferente da pertença do predicado ao sujeito lógico, segundo a compreensão daquele, pois, do ponto de vista da compreensão, um objeto inteligível é uma "luz" oferecida ao proferente-visante, enquanto que, do ponto de vista da extensão, esse mesmo objeto aparece como essa mesma luz a refletir-se noutros objetos inteligíveis.
  • Pertencer à compreensão de um sujeito lógico significa, para um predicado, pertencer pura e simplesmente ao que esse sujeito lógico é, enquanto que pertencer à extensão de um predicato significa, para um sujeito lógico, contar entre os objetos inteligíveis em que se reencontram, entre outros, todas as notas desse predicado.
  • Reduzir a inteligibilidade de um objeto inteligível apenas à sua compreensão é destruir a hierarquia dos inteligíveis, enquanto que reduzi-la apenas à sua extensão, como é comum, é ignorar que todo o objeto inteligível é, em si mesmo, uma "luz" a escrutinar, focando-se apenas em relacionamentos de conteúdo e continente.

V. A Compreensão e Extensão nos Casos do Singular e do Universal

  • No caso de um objeto inteligível correspondente a um objeto sensível singular, a multitude das suas notas é inesgotável e a sua compreensão é ilimitada, enquanto a sua extensão, reduzindo-se a ele próprio, é nula.
  • Pelo contrário, a noção inteligível universal "Ser", que se aplica a todo o objeto de conhecimento, tem uma extensão sem limites, mas é a mais pobre de todas, absolutamente desprovida de notas, tendo uma compreensão nula, sendo o único objeto com esta particularidade.
  • Conclui-se que, se um objeto sensível singular escapa a uma descrição exaustiva devido à inumerabilidade das suas notas, o objeto inteligível "Ser" escapa a qualquer descrição pela razão inversa da sua vacuidade notacional.

VI. Observações sobre a Proposição e a Classificação dos Inteligíveis

  • Em toda a proposição afirmativa, o verbo copulativo "ser" está sempre presente, mesmo quando dissimulado no seio de outro verbo, sendo tais proposições redutíveis à forma típica onde o "ser" aparece explicitamente.
  • O termo "universal" é aplicado a todo o objeto de pensamento inteligível que não corresponda a um ser sensível determinado, sendo mais preciso considerar a maioria dos inteligíveis como "gerais" (gêneros) em vez de verdadeiramente universais, reservando este último termo para o "Ser".
  • Na teoria aristotélica, os inteligíveis formam um todo hierarquizado de gêneros e espécies, limitado no topo pelo "Ser" e na base pelos objetos sensíveis singulares, sendo que os gêneros mais gerais (categorias) não são subsumidos pelo "Ser" devido à sua vacuidade notacional, que impede a atuação de uma diferença especificadora.

VII. O Juízo como Expressão de uma Verdade Vidente

  • Toda a proposição é um objeto inteligível composto, visado no mental pela radicalidade subjetiva, e o que constitui o juízo é a certeza do espírito de ter visto claramente que o predicado pertence (ou não) ao sujeito lógico, expressando assim uma verdade, um estado de coisas indiscutível.
  • Para julgar, é preciso ver, existindo apenas duas maneiras de ver a verdade de um relacionamento de pertença: uma visão imediata, que conduz a um juízo imediato por intuição, ou uma visão mediata, alcançada ao termo de um raciocínio.

VIII. O Raciocínio como Série de Intuições Ligadas

  • O raciocínio, enquanto atividade mental discursiva, é redutível a uma sucessão de visões imediatas (operações intermédias) ligadas de tal modo que o espírito vê mediatamente um relacionamento de pertença que não via imediatamente, conduzindo-o a emitir um juízo conclusivo.
  • No silogismo, o espírito apreende intuitivamente um antecedente composto por dois juízos ligados por um termo médio comum (E), e, examinando este conjunto, vê que se o predicado (P) pertence a E e E pertence ao sujeito lógico (S), então P pertence necessariamente a S, deduzindo assim a conclusão.
  • Este juízo conclusivo é desencadeado pela apreensão intuitiva e simultânea dos dois juízos do antecedente, sendo que, se o espírito não vir este acercamento imposto pelo elemento comum, o raciocínio lhe escapará.
  • Quando as proposições judicativas do antecedente podem ser lidas como relacionamentos de pertença de cada sujeito lógico à extensão do seu predicado, o silogismo pode ser figurado pelos círculos concêntricos de Euler, ilustrando a relação de continência entre os termos.

Ver online : Allard l’Olivier


[ALLARD L’OLIVIER, André. L’illumination du coeur. Paris: Ed. Traditionnelles, 1977]